terça-feira, 17 de novembro de 2009

Censura por outro nome

Por Diogo Costa

OrdemLivre.Org

Concordo com o PT: “o arcabouço legal brasileiro” tangente aos meios de telecomunicação “é anacrônico, autoritário, fragmentado e privilegia os grupos comerciais, em detrimento dos interesses da população”. Como se resolve isso? Para mim, com mais liberdade para a imprensa. Para o PT, com mais anacronismo, autoritarismo e distribuição de privilégios.

Nos últimos anos, temos assistido à tentativa do governo de manipular a mídia com um aumento sem precedentes nos gastos com anúncios públicos. Mas o povo brasileiro continua elegendo os meios de comunicação que lhe oferecem um produto melhor. Diante disso, o governo foi buscar o meio mais efetivo de silenciar de vez os dissidentes.

Censura é o único termo que descreve com exatidão as ações pretendidas pelo PT de acordo com a recém lançada resolução estratégica do partido para a Conferência Nacional de Comunicação (Confecom), um fórum armado pelo governo para debater novas formas de intervenção estatal na imprensa.

O dicionário Houaiss define censura como "exame a que são submetidos trabalhos de cunho artístico ou informativo, ger. com base em critérios de caráter moral ou político, para decidir sobre a conveniência de serem ou não liberados para apresentação ou exibição ao público em geral". É isso que o PT entende por "controle público e social" no item 3 da resolução, em que o partido propõe o estabelecimento de "mecanismos efetivos de sanção aos meios de comunicação".

Só que censura é um termo feio, especialmente para um país que a conheceu de perto durante o regime militar. Melhor chamar de "democratização", ou de "políticas públicas de comunicação com poderes permanentes de fiscalização de regulamentação" que, no final das contas, significa a mesma coisa: dotar o governo de poder decisório e fiscalizador sobre formato e conteúdo dos veículos da mídia.

O bode expiatório da resolução são as empresas de comunicação que concentram grande poder econômico (e que costumam frustrar os planos do governo com análises e investigações). Mas o poder econômico da imprensa tradicional não é capaz de deter a atual revolução tecnológica da comunicação. Consegue no máximo emular com algum atraso seus novos competidores muito mais dinâmicos e nebulizados. Jornais de papel e canais de TV de todo o mundo lutam contra números decrescentes para não parecerem resquícios do século passado. Se há algum agente capaz de interromper os fluxos de informação que têm transformado a forma como nos comunicamos, esse agente é o Estado.

Interromper o fluxo de informação na mídia impressa, na TV e no rádio não é fácil, porém não é impossível. Difícil mesmo será censurar a internet. Para tanto, o partido teria que lançar mão de novas táticas, como a estatização das redes de banda larga. É o que sugere a redação da resolução do PT quando fala de "rede em regime público para banda larga e telefonia celular" distinta da "produção/programação de conteúdo", para que o governo possa utilizar "mecanismos de controle público" e de "regulação sobre conteúdo". Quem fará esse controle? Os Conselhos de Comunicação Social, com a ajuda do Ministério Público e da Anatel, que deverá ter "um papel mais democrático". Talvez na sua visita ao Brasil Mahmoud Ahmadinejad possa ensinar aos censores brasileiros como seu governo construiu a sofisticada firewall iraniana.

Os eufemismos da resolução do PT para a Confecom servem para confundir sociedade civil com Estado e passar a impressão de que as decisões tomadas por um partido e seus aliados são a mais autêntica expressão das decisões dos brasileiros. Fala-se, por exemplo, de Direito de Resposta "coletivo e difuso, de maneira que a sociedade, através de suas instâncias representativas, possa reivindicá-lo". Meu grifo é para destacar como se transforma um anacronismo, como o Direito de Resposta, em um instrumento que permite que o governo, além de fiscalizar, controlar e regulamentar, ainda produza diretamente o conteúdo de um jornal, revista ou qualquer outro veículo de comunicação.

Não podemos nos enganar. Empregar o termo “democracia” para descrever a intervenção na mídia não elimina magicamente seu autoritarismo essencial, apenas o esconde. As medidas propostas pela resolução petista são voltadas para diminuir cada vez mais o poder de escolha dos consumidores e aumentar cada vez mais o poder dos políticos e seus parceiros. Afinal, a quem deve servir a mídia, a nós ou a eles?

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