sábado, 3 de outubro de 2009

Honduras só quer uma eleição

Por Mary Anastasia O'Grady


Nesse ano, durante um almoço de recepção para o presidente brasileiro Lula da Silva, uma autoridade brasileira me explicou que a razão por que o Brasil não levanta a voz para falar de direitos humanos na ditadura cubana é o desejo de não interferir nos assuntos domésticos da ilha. Aparentemente, essa política de não-intervenção não se aplica a Honduras, um país democrático.

Na segunda passada, o ex-presidente hondurenho Manuel Zelaya, que foi preso, deportado e legalmente removido do cargo em 28 de junho, retornou escondido a Tegucigalpa e procurou abrigo na embaixada brasileira. Zelaya disse a uma rádio hondurenha que seu plano de retorno foi feito em consulta com Lula e com o ministro Celso Amorim. O Brasil diz que não teve nada a ver com o contrabando de Zelaya para dentro do país, o que é a mesma coisa que chamar o ex-presidente de Honduras de mentiroso — com o que muitos hondurenhos concordariam.

Há acusações de corrupção contra Zelaya em Honduras, mas o Brasil, país “não-invervencionista”, recusa-se a entregá-lo às autoridades. Pelo contrário, está permitindo que ele use a embaixada como centro de comando a partir do qual ele tem convocado seus violentos defensores às ruas.

As simpatias de Lula pela extrema-esquerda e sua amizade com Fidel Castro são famosas. Em casa, ele não age como um militante de esquerda dos anos 1970 por que os brasileiros não admitiriam isso. Ele está constrangido pelas instituições, pela realidade econômica e pela pressão pública. Sua admiração pelo comunismo até diminuiu um pouco quando a Venezuela e a Bolívia tentaram nacionalizar investimentos brasileiros. No entanto, ele tem de jogar migalhas a seu Ministério das Relações Exteriores notoriamente esquerdista, e é aí que Honduras vem a calhar.

O costume de ser moderado no próprio país e extremista no estrangeiro não é peculiar ao Brasil. Muitos presidentes de países latino-americanos fazem a mesma coisa. O que é assustador é que os EUA parecem estar adotando uma política similar.

Na semana passada, Tegucigalpa foi atacada pelos zelayistas. Eles queimaram pneus nas ruas, vandalizaram casas, saquearam lojas e fecharam estradas. Mas os EUA insistiram em seu apoio a Zelaya. Sem emitir qualquer parecer jurídico, Washington decretou mais uma vez que um presidente que tentou jogar a constituição no lixo deveria ser restabelecido — caso contrário, as eleições de novembro não serão reconhecidas.

Por que os EUA ameaçam enfraquecer uma eleição que provavelmente restauraria a paz e a segurança? Hugo Chávez, da Venezuela, talvez tenha respondido a essa pergunta em seu discurso na assembléia geral da ONU na quinta passada. Ao tomar a palavra, Chávez disse à sua platéia que não estava sentindo cheiro de “enxofre” como no ano passado. Isso foi uma referência à sua última boutade na ONU, quando disse que George W. Bush era um demônio que tinha deixado um cheiro de enxofre. Neste ano, segundo Chávez, havia um cheiro de “esperança”.

Obama claramente tem a aceitação do tirano latino-americano e a política americana para Honduras tem ajudado. Mas será que essa grande honra vai durar mais do que um soluço e trazer algum benefício? Provavelmente não. Além de poupar Obama das alfinetadas que deu em Bush, Chávez não mostra ter qualquer inclinação de ser um bom vizinho. Está ampliando as forças armadas, e fala até em suas próprias ambições nucleares.

A posição do governo Obama a respeito da eleição de Honduras é vergonhosa. Será que alguém acredita que, se Fidel Castro dissesse amanhã que realizaria eleições livres e convidasse o mundo inteiro para participar como observadores, os EUA rejeitariam a idéia porque Cuba é uma ditadura militar? Seria absurdo demais.

Em Nova York semana passada, Ricardo Martinelli, presidente do Panamá, me disse que acredita que “a única maneira, a melhor maneira de sair do problema hondurenho é permitir que o povo hondurenho realize uma eleição livre e participativa em que possa eleger quem quer que julgue ser o melhor candidato para seu governo”. Martinelli observa que os candidatos nessa disputa foram escolhidos enquanto Zelaya ainda era presidente. Micheletti, o presidente hondurenho, participou das prévias, mas perdeu para Elvin Santos, que agora é candidato pelo partido de Zelaya, e também quer que as eleições aconteçam. O Panamá já passou pelo problema da democracia interrompida, diz Martinelli, e foram as eleições que o resolveram.

Martinelli diz — e também muitos membros do governo de Honduras — que deportar Zelaya foi um erro. Ele também diz que esperava que as negociações em San José, na Costa Rica, chegassem a um acordo para decidir a disputa. Mas também acrescente que aquilo que Zelaya exige “não está dentro da lei hondurenha”. Portanto, agora a resposta é uma eleição.

Uma eleição transparente é o caminho para a estabilidade política que o Mundo Livre escolheu. É rude e inadequado da parte dos EUA ameaçar esse processo. Será que Obama dá tanto valor assim às gentilezas de Hugo Chávez? Em caso afirmativo, estamos todos encrencados.





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