terça-feira, 22 de setembro de 2009

IRRESPONSÁVEIS, FALASTRÕES E PERIGOSOS




Por Reinaldo Azevedo


O Brasil não reconhece o governo de Honduras. Muito bem. É parte do jogo e do concerto das nações. Este não-reconhecimento tem graus e vai da suspensão de qualquer cooperação até o fechamento da embaixada, com a retirada de todo o corpo diplomático. Mas aquilo a que se assiste em Tegucigalpa é outra coisa: o Itamaraty, numa ação concertada com Hugo Chávez e Daniel Ortega, criou meios para a entrada de Manuel Zelaya no país, violando a Constituição do Brasil, a Constituição de Honduras e a Carta da OEA. Já demonstrei isso. Mas o bolivarianinho Celso Amorim achou pouco: permitiu que Manuel Zelaya usasse as dependências da embaixada para convocar os seus seguidores para a “resistência”.


Embora fale em nome da “paz”, o apelo do bandoleiro deposto não descarta a guerra civil: “Pátria, restituição ou morte”. Lula e Amorim usam a pobre Honduras de forma miserável para exibir seus músculos (santo Deus!!!) e esperam que os hondurenhos tenham o juízo que eles não têm. Afinal, que compromisso o chamado “governo de fato” pode ter com a inviolabilidade da embaixada do Brasil se é considerado um “fora-da-lei”? “Creio que, no momento, tudo que se pode dizer é reiterar nosso pedido diário para que ambas as partes desistam de ações que tenham um desenlace violento”, afirmou Ian Kelly, porta-voz do departamento de Estado dos EUA. E, então, chegamos ao problema.


Os americanos já perceberam — e vai demorar bastante tempo até que a opinião pública mundial se dê conta — que Barack Obama como “líder” do Ocidente é uma piada. Poderíamos supor que a ação do eixo Lula-Chávez-Ortega contou com a bênção dos EUA. Não faltará quem vá buscar indícios de que a Casa Branca sempre esteve no controle. Bobagem! O governo americano foi surpreendido pelo protagonismo da esquerda carnívora (Chávez e Ortega) unida à esquerda herbívora (Lula).


Tenho me correspondido com hondurenhos. Não há menor a possibilidade de Zelaya governar o país a não ser com leis de exceção. Seus únicos apoios são sindicatos dominados por grupelhos de esquerda. Os EUA já tinham se dado conta disso e contavam empurrar a situação com a barriga até novembro, quando há eleições. Mas não deixaram claro que uma ingerência nos assuntos internos de Honduras era inaceitável. Então os lobos e os ruminantes entraram em ação. Tudo debaixo do queixo de estátua de Obama. Se a opinião pública ainda não percebeu que ele é fraco, hesitante, colegial, os governos já entenderam tudo. Pode passar a mão no joelho do rapaz, que a reação indignada virá umas 48 horas depois.


Antes que volte a Brasil e Honduras, mais algumas considerações sobre o mito já despedaçado. Obama é patético. A recente decisão de renunciar ao escudo antimísseis na Europa Oriental, dançando cancã para Putin, de saiote levantado, sem exigir uma miserável contrapartida, dá conta de com quem o mundo está lidando. Há uma explicação bastante sofisticada, inteligente e errada, para o caso: ele agiria assim porque pretende ter o apoio da Rússia, que pressionaria o Irã a não dar seqüência a seu plano nuclear. Aiatolás se interessam por russos enquanto russos forem úteis às pretensões, vamos dizer, “imperialistas” dos aiatolás. No dia em que a Rússia deixar de ser um bom parceiro, o Irã vai fazer o que acha certo. E, nesse caso, pode ser tarde demais.


Que fique o registro: eu não achava uma grande idéia instalar os escudos na Europa Oriental. Tomada a decisão pelo governo americano (pouco importa quem era o presidente), não se volta atrás assim, sem mais nem aquela. Sem contar que Obama deixou na mão os aliados dos EUA na Europa Oriental. Ele poderia ter parado por aí. Mas foi além: como tem a pretensão de governar os EUA a partir dos meios de comunicação, saiu negando que estivesse tentando agradar a Rússia. Ou seja, estava tentando agradar a Rússia. É um primitivo vendido por seus mistificadores como grande estrategista. O que me consola é que não será reeleito.


Por que essa digressão sobre Obama e o escudo? Chamo a atenção dos senhores para o fato de que um presidente dos EUA que faz essas patetices é absolutamente compatível com este que assiste à segunda tentativa de golpe civil bolivariano em Honduras. O primeiro foi repelido pela Justiça, pelo Congresso, pelas Forças Armadas e pela população. Mas Chávez não se conformou. Daniel Ortega mandou homens para a fronteira. Súcias de venezuelanos e nicaragüenses entraram no país para comandar o banho de sangue, frustrado porque é tal o ódio que o país tem a Zelaya, que falta a um dos lados massa para o confronto. Como tudo fracassou, então os neogorilas do continente rasgam a Carta da OEA, pisoteiam na Constituição hondurenha e garantem a Zelaya a volta ao país, usando a embaixada brasileira em Tegucigalpa como palco dessa pantomima.


Sim, no Brasil, há quem veja nessa atitude um gesto de coragem, ousadia e humanismo até. Sem dúvida. A prova maior da grandeza moral de Lula é sua undécima defesa da ditadura cubana, agora nas Nações Unidas. O governo brasileiro insufla a guerra civil num país que não tem presos de consciência e respeita as normas comezinhas do Estado de Direito e pede que uma tirania seja tratada como um governo respeitável. E alguns tontos no Brasil se regozijam. Ora, digamos que a Justiça, o Congresso e as Forças Armadas tivessem deposto Zelaya em desacordo com a Constituição, O QUE É MENTIRA, pergunto: isso justifica que o Brasil, para restaurar a democracia (que nunca deixou de existir), viole as regras mais básicas do direito internacional?


Porta-vozes de Celso Amorim na imprensa brasileira já se encarregam de espalhar a versão de que Zelaya ter “escolhido” (!!!) o Brasil é sinal do prestígio do país na região.


A propósito: aquela gente que ficou torrando a minha paciência apontando o “golpe” que derrubou Zelaya não vai reclamar da óbvia ingerência do Brasil nos assuntos internos de um outro país e do desrespeito à Carta da OEA? Micheletti pediu que o Brasil entregue Zelaya à Justiça. Que Justiça? Lula e Amorim, pelo visto, não reconhecem nem o Congresso nem o Judiciário de Honduras. A reinstalação de Zelaya no poder só poderia se dar se ele fosse posto num trono, com rei absolutista de Honduras, não como presidente.


De todas as porra-louquices internacionais feitas pelo Megalonanico, esta foi, sem dúvida, a maior e mais ousada, pautada, ademais, pela propaganda. Lula vai defender o fim do embargo comercial americano à tirania cubana com a “força” de quem intervém de modo grotesco na realidade interna de um outro país, mesmo com o risco de lançá-lo numa guerra civil. Lula queria ser notícia no mundo. Até havia pouco, noves fora a discurseria mistificadora, o governo Lula era, em política internacional, arrogante e falastrão. Agora estamos vendo que pode ser também perigoso.


Não faz tempo, a Economist perguntou de que lado estava o Brasil. A resposta era e é clara: do lado das ditaduras e dos que vislumbram uma “nova ordem” com o declínio dos EUA. Começamos a ver que cara ela vai assumindo.


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