Por Klauber Pires
Creio que pela primeira vez na história havemos de analisar um embargo econômico sobre uma democracia, o que faz de nosso trabalho um desafio, senão uma aposta. Até então, tais medidas têm sido endereçadas a regimes totalitários, o que nos deve imensamente servir de alarme.
Estes países – Cuba, Iraque, Iran, Coréia do Norte e outros dignos de estarem num mesmo cesto, geralmente têm se saído muito bem contra bloqueios, de modo que estes pouco os afetam. A explicação é simples: o povo morre esfaimado e doente, mas o regime sobrevive. Os ditadores até mesmo aprendem a fazer da carência geral um jogo de castigos e recompensas para os dissidentes e seus seguidores, respectivamente.
Honduras é uma democracia muito jovem. Não obstante sua independência completa date de 1838 (veio a se tornar independente da Espanha em 1821), uma sucessão de governos caudilhistas manteve a nação imersa em estagnação e pobreza, a ponto de atualmente não ser o país senão o segundo em miséria, restando apenas ao Haiti a condição de líder de tão funesta lista.
Assim se manifesta o Índice de Liberdade Econômica da Heritage Foundation :
Honduras recebe os maiores escores pela liberdade econômica, liberdade fiscal, tamanho do governo e liberdade financeira. O imposto de renda tem alíquotas razoavelmente baixas, tanto para pessoas físicas quanto para jurídicas e a carga tributária geral é moderada. A liberdade financeira é estimulada pelo setor bancário em desenvolvimento, ao qual têm sido instituídas normas mais firmes e uma auditoria mais transparente.
A pobreza e a desigualdade persistem, e esforços para reestruturar o setor público precisam ser revitalizados. A liberdade econômica geral de Honduras sofre mais da falta de capacidade institucional de proteger os direitos de propriedade e de combater a corrupção em muitos aspectos da atividade econômica. A administração pública é ineficiente e largamente tida como corrupta. A lei e a ordem são sabotadas por uma segurança básica fraca.
Não obstante, o pequeno país centro-americano ocupa uma posição notadamente melhor do que o Brasil, com o 91º lugar mundial, sendo 14 posições à frente do gigante deitado eternamente em berço esplêndido, e embora o último relatório de Hernando de Soto o tenha retirado 0,2 pontos em relação ao anterior, por conta de imposições de mais burocracia aos contratos trabalhistas, prevejo que um próximo relatório há de rever para cima a credibilidade das instituições, por conta de deposição do bolivariano “Mel” Zelaya.
Desde a nova constituição de 1982 – esta cujos dispositivos garantidores do regime democrático foram pela primeira vez testados – o país tem melhorado de forma lenta, porém, gradativa e consistente – seus indicadores sociais. De 1980 a 2004, a parcela da população que vivia com um dólar americano ou menos por dia decresceu de 25,43% para 15,27%, e a parcela que vivia com dois dólares ou menos caiu de 51,97% para 39,52%. Estes índices promissores, todavia, têm sido sustados durante a administração do então presidente Jose Manuel “Mel” Zelaya Rosales, por conta do foco mais voltado para o combate à desigualdade do que em promover o crescimento, e fortemente devido ao aumento da criminalidade, em especial, do tráfico de drogas e da formação de gangues juvenis, o que parece ter sido percebido pela população, que hoje massivamente rejeita o seu retorno. Este combate à desigualdade, entretanto, lido corretamente, nos leva ao caminho do estímulo ao confronto entre classes sociais, à distribuição de benefícios eleitoreiros e à imposição de políticas compensatórias.
Na pauta de exportações, sobressaem as commodities, à frente o café, a banana, o camarão, melões e têxteis artesanais, com também alguns minérios e turismo, sendo os principais parceiros comerciais os Estados Unidos, a União Européia e o Japão.
No plano militar, este país é muito fraco, não possuindo sequer tanques de guerra pesados, senão uma vintena ou pouco mais de carros de combate leves (com canhões de 76 mm) e veículos de reconhecimento e de patrulha.
A marinha é composta, sobretudo, por pequenas embarcações de vigilância costeira e fluvial. Os maiores trunfos ocorrem por conta da força aérea, mas ela mesma contando com não mais do que trinta caças modernos. No geral, mal dá para conter uma invasão, para o caso de uma bem armada Venezuela a realizar, ainda mais se contar com Cuba e Nicarágua a fornecer apoio. Isto, claro, é improvável, mas quem há de prever o que se passa na cabeça de um louco? No quadro atual, apenas poderá impedi-la os Estados Unidos, que mesmo com a gestão do socialista Barack Hussein Obama pode se vir obrigado a auxiliar um aliado histórico.
Feitas as considerações acima, tenho que Honduras seja um país por demais frágil a um embargo decidido por parte dos Estados Unidos ou da União Européia.
Contra o bloqueio dos depósitos no exterior, há um ponto a favor, que é o livre trânsito de moedas estrangeiras, o que pode remediar parcialmente a falta de liquidez, já que o governo e o empresariado pode ter entesourado numerário em espécie ou em bancos desimpedidos pelas sanções.
Pesa sobremaneira também a interrupção do fornecimento de petróleo, com a própria Venezuela como o principal exportador, e que já fez questão de impô-lo, o que pode trazer o país a uma situação de utilizar as suas reservas tão somente para a segurança nacional, pelo menos no curto prazo.
Finalmente, a sua pauta de exportações é extremamente vulnerável, desde que as cargas , elas próprias de pouco valor agregado, possam vir a ser objeto de quarentenas em portos de destino ou intermediários, e por isto venham a se perder por apodrecimento.
Deitado o cenário tal como o apresentamos, tenho que o povo hondurenho tem à frente a prova de fogo de sua autonomia como um país livre e soberano. Destaque-se que ao contrário da entorpecida nação tupiniquim, não é preciso muito esforço para convencer os hondurenhos de que o socialismo de tintas bolivarianas só os levará à miséria extrema e à degradação social de forma violenta. Este filme eles já assistiram de perto com El Salvador e a própria Nicarágua.
Não obstante tão cruéis e covardes dificuldades, o tempo parece correr a favor desta corajosa nação, que quer firmemente começar a acertar. Com a descoberta dos computadores que já guardavam antecipadamente os resultados do frustrado referendo que era o objeto da luta de Zelaya, e com a revelação dos passos ostensivos de Hugo Chávez e de Daniel Ortega na coordenação dos movimentos de insubordinação popular, a mídia cooptada não poderá sustentar a mentira por muito tempo, ainda mais nestes tempos em que a internet começa a mostrar a sua força, com milhares de blogs a revelar os fatos e a denunciar a mídia tradicional engajada.
Isto eu já vinha verificando com a mudança gradual de tom no noticiário regional do Pará. Aqui, na sexta-feira passada, o “O Liberal” ainda tratava o caso como golpe, mas já admitia ter havido uma questão de ordem constitucional, embora tratasse isto como a alegação do governo provisório. O “O Diário do Pará”, nem sequer usou o termo golpe, e já começou a divulgar as manobras de Caracas. Parece ter havido o mesmo com jornais de maior importância, tais como “O Estado de São Paulo” e “O Globo”.
Isto posto, a crescimento da indignação popular nos EUA podem fazer Barack Hussein Obama rever a sua posição, assim como na União Européia. Quanto ao Japão, não creio que se importará em oferecer dificuldades aos hondurenhos; antes, pode aproveitar para incrementar as suas relações. O mesmo se diga com Taiwan, este mesmo uma vítima de um bloqueio conduzido pela China continental, que pode vir a se tornar um parceiro importante e capaz de absorver por completo a economia hondurenha.
Há portanto, duas linhas que devem se cruzar, uma em direção às vicissitudes que há de sofrer o frágil país em face da imposição de sanções internacionais, e outra com relação a uma inversão da opinião pública que seja capaz de reverter as decisões infelizes nos EUA e na União Européia.
Às vezes, a história conclama para o seu livro de ouro indivíduos ou nações que nem sequer imaginavam pertencer às notas de rodapé. Parece ser este o caso de Honduras, se o seu povo se mostrar disposto a agüentar firme até que a verdade prevaleça, o que não deve tardar. Torço por eles e que sirvam de exemplo aos brasileiros, tão inermes.
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