segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Ciosa e licenciosa

Por Percival Puggina

Mídia Sem Máscara
Pois o meu pensamento, então, lá se vai para o paradoxo de uma sociedade tão ciosa sobre os desvios de conduta de seus senadores e deputados e tão licenciosa em relação ao presidente Lula, mesmo quando ele se ergue em ardorosa apologia de uns e outros.
Desde os tempos do programa "Você decide" eu sei que para consistente maioria do povo brasileiro, ético é o que lhe concede alguma vantagem que outros deverão pagar e antiética é a vantagem alheia cuja conta vem para si. O grande critério moral do brasileiro médio é o seu próprio benefício. O sujeito que encontra dinheiro e procura um modo de devolver é um tipo tão fora do padrão quanto o dono que morde o cachorro. Vira objeto de curiosidade nacional, vai para as manchetes, ganha foto na capa e abraço do presidente.

Não estou pensando em pés-rapados. Estou pensando no cidadão comum, membro de uma consistente maioria, que tanto pode estar na maloca ou no palácio, na vila ou no bispado (afinal, não foi o prelado brasileiro D. Tomás Balduíno que saiu em espontânea, devota e cínica defesa do companheiro, fornicador, bispo paraguaio, D. Lugo?). Na linha do critério moral que expus no parágrafo anterior, pobre de D. Lugo, se fosse "de direita"! O bispo emérito de Goiás não o deixaria sem penitências sequer pelos maus pensamentos. Reitero, então: não estou pensando em pés-rapados.
Tanto assim, que o tema deste artigo é a relação da sociedade com o excelentíssimo senhor presidente da República. Confesso que estou com um pensamento recorrente. Cada vez que acesso a web, leio os jornais ou ouço as manifestações da cidadania sobre os escândalos no Senado Federal, sobre a dedicação do presidente Sarney à própria família, ou sobre as manifestações de estima do nosso presidente por todos os personagens que a mídia aponta à execração pública, eu fico com jeito de disco arranhado. Para quem nasceu em tempos de cd, os antigos ouvíamos música em discos de vinil cujos sulcos eram percorridos por uma agulha e, quando arranhados, repetiam sempre a mesma coisa. Pois o meu pensamento, então, lá se vai para o paradoxo de uma sociedade tão ciosa sobre os desvios de conduta de seus senadores e deputados e tão licenciosa em relação ao presidente Lula, mesmo quando ele se ergue em ardorosa apologia de uns e outros.
Experimente defender Sarney em público. Você vai tomar uma vaia inesquecível! Tente argumentar em favor de Fernando Collor. Seus amigos desviarão para a calçada oposta ao avistá-lo. Ensaie dizer que Severino Cavalcanti é uma respeitável liderança nordestina. Seus filhos renegarão o pai. Aceite um abraço de Maluf, convide Jader Barbalho para jantar, elogie Renan Calheiros. Sua mulher pedirá divórcio porque o marido é um pervertido.

Lula pode fazer tudo isso e continuar surfando nas ondas da popularidade e numa aprovação superior a 80% da opinião pública nacional. Sua excelência é o brasileiro médio por excelência. E a sua moralidade é a moralidade do brasileiro médio. Ou seja, é um tremendo cara-de-pau.


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