Por Renato Lima
Lina Vieira, ex-secretária da Receita Federal, quebrou um silêncio que durava desde que foi fritada e demitida do cargo, e revelou que contrariou interesses da poderosa ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff. Numa conversa, segundo relato de Lina, Dilma pediu que uma auditoria nas empresas do senador Sarney fosse “acelerada”, o que ela entendeu (dado o contexto, o pedido de sigilo da audiência, entre outros fatores) como aliviar a barra para o político maranhense.
A revelação de Lina Vieira foi publicada pela Folha de São Paulo deste domingo (9 de agosto). Já entrevistei Lina em algumas ocasiões. Quando era a Secretária de Finanças do Rio Grande do Norte, de uma administração ligada ao governo federal (Vilma de Faria, do PSB), e quando veio chefiar a Receita Federal em Pernambuco. Funcionária de carreira, sempre teve fama de grande conhecimento técnico e retidão. E também liderança, já que era representante dos Estados no Conselho Nacional de Política Fazendária. Sua demissão – seguido de um processo de fritura – fez muita gente estranhar as razões. Agora elas são conhecidas. Ou, pelo menos, parcialmente.
A primeira reação de Dilma, em relação à entrevista, foi negar, mais do que o pedido, até mesmo o encontro. Conhecendo as duas personalidades (Lina e Dilma) não é de se estranhar. Vamos pegar apenas três episódios envolvendo a ministra-chefe da Casa Civil. O dossiê de gastos do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (FHC), os balanços do PAC e o seu currículo.
Dilma é a mesma que colocou sua equipe para preparar um dossiê contra Dona Ruth e Fernando Henrique Cardoso, levantando os gastos que os dois tiveram para “contrapor” ao escândalo dos cartões corporativos. De posse do dossiê, a imprensa o publicou, e a primeira reação de Dilma foi dizer que o documento era montagem. Depois se comprovou que a planilha era real, inclusive que o documento saiu dos computadores da própria Casa Civil. Lá foi feito, e a pedido da sua mais fiel assessora, Erenice Guerra.
Dilma também é um às em mostrar um Brasil que avança a passos largos nas suas apresentações do PAC. Quando algo está em vermelho, a Casa Civil exclui a obra e coloca outra no comecinho, mas que apareça em sinal verde. Ela também dizia ser mestra e doutora pela Unicamp em economia, dado que constava da Petrobras (como integrante do seu conselho de administração), do seu currículo acadêmico Lattes e de entrevistas da qual ela participou, por exemplo em duas vezes no Roda Viva da TV Cultura. Em nenhum momento, nem de leve, ela revelou que nunca havia apresentado qualquer trabalho que lhe gabaritasse o título que dizia possuir.
Quando algo não lhe agrada, a primeira reação de Dilma é negar. Depois, comprovada a mentira, ela relativiza a importância do fato. No caso do dossiê, travava-se apenas de um “levantamento de dados”. Da lentidão do PAC, de lento apenas se aqui fosse a Suíça, mas muito rápido para os padrões brasileiros. Do seu currículo, um engano de assessores. Lina reafirmou que teve o encontro com Dilma e que foi feito o pedido. “Não custava nada ela ter dito a verdade. Qual a dificuldade? Na minha biografia não existe mentira”, afirmou Lina em nova entrevista à Folha. Não será surpresa nenhuma Dilma dizer que agora se lembra do encontro, mas que agilizar significava colocar mais servidores para fazer a auditoria. Ou ser mais eficiente. Qualquer coisa, desde que não seja o motivo suspeito.
Quem usa a estrutura da Casa Civil para preparar dossiê, utiliza aparato do Estado para fins políticos pessoais. Isso ficou comprovado. O PAC não anda no ritmo alardeado e o currículo era falso. Por isso, depois de um rastro de tantas mentiras, fica difícil não crer que a ministra também pressionou para que a Receita aliviasse a barra para o senador Sarney. Resumindo, é um negócio de extremo risco comprar um carro usado da ministra da Casa Civil.
O problema não é apenas Dilma. Mas a questão de fundo é desinstitucionalização do Estado brasileiro, que permite essas, vamos dizer assim, dilmadas. Dilma dilma, Sarney dilma, Collor dilma e o Brasil está virando um dilmão. Onde a mentira é recompensada politicamente e não há mais nada institucional de freios e contrapesos que interrompa esse trem que segue expresso na direção contrária ao Estado de direito.
Nenhum comentário:
Postar um comentário