domingo, 30 de agosto de 2009

COMO É? O BRASIL JÁ É MAIOR DO QUE ANTES DA CRISE?




Na manchete deste domingo, lê-se no Estadão: “Um ano depois, Brasil passa no teste da crise mundial”. Ok. Entendo que passar no teste é não ter feito nenhuma bobagem importante ou agredido muito alguns fundamentos que colaboraram para enfrentar estes dias difíceis. Na manchete do Estadão Online e na principal página de economia do jornal impresso, lê-se reportagem de Fernando Dantas: “Um ano depois, Brasil passa no teste e sai da crise maior do que entrou”. E na linha fina (é jargão profissional, leitor: trata-se daquele subtítulo): “Para especialistas, avanço do País e de outros emergentes é uma das características do mundo pós-crise”. Fiquei curioso e fui ler o que dizem os especialistas.


Pois é… Acontece que não há fala de um só especialista que justifique a afirmação que está no título e também no lead da reportagem. Mais ainda: os gráficos apresentados na capa do caderno de Economia demonstram que o Brasil, a exemplo do resto do mundo, está menor, evidentemente, do que estaria sem a crise: a produção industrial despencou, as vendas externas caíram drasticamente, as demissões dispararam, e a arrecadação naufragou. Tudo isso está lá, em imagens e números inequívocos.


Então por que se diz que o país “saiu maior do que entrou?” Eis o problema: não se diz por quê. Apenas se afirma que sim. Posso presumir uma coisa ou outra juntando falas.


A expectativa em relação à crise no mundo — e, pois, também no Brasil — era muito ruim. Alguns fundamentos da economia brasileira, como destaca Affonso Celso Pastore — câmbio flutuante, bom nível de reservas, bancos pouco alavancados — permitiram ao país enfrentar a crise com menos sofrimento do que se viu em alguns outros lugares. Não impediram o país de entrar em recessão (afinal, ele existiu), mas lhe deram boa musculatura. O país já está maior agora do que antes da crise? Ninguém diz isso na reportagem pela simples e óbvia razão de que isso não é verdade. Claro, se tiver crescido 0,01% ao fim desde ano isso já é ser “maior”, né?


Atenção! O pessimismo não é uma categoria moral superior ao otimismo, já escrevei isso aqui algumas vezes. O Brasil, que teve a sua economia rearranjada pelo Plano Real, evitou, felizmente, algumas armadilhas — ao menos as mais perigosas — do populismo econômico. Tudo isso pode ser constatado — e, com efeito, vinha sendo apontado por muita gente. Afirmar, no entanto, que o país “sai maior do que entrou” é, como direi?, ir um tanto além daquela besteira de que, por aqui, a crise seria só “uma marolinha”. Segundo essa manchete do Estadão, nem marolinha foi: aproveitamos uma janela de oportunidades!!! Se o país é maior agora do que antes da crise, então a crise foi uma coisa positiva para nós. E isso, lamento, não é questão de gosto, opinião ou viés analítico: é só uma bobagem.


“Ah, cresceu a importância relativa do Brasil!”


“O Brasil, agora, é mais notado do que antes da crise!”


“Ah, o mundo vê que a economia brasileira é mais sólida do que parecia!”


Ok, ok, ok. Tudo isso pode ser verdadeiro, e nada disso — ou qualquer outro elogio feito pelos “especialistas” na reportagem — autoriza a conclusão de que o Brasil sai da crise “maior do que entrou”. A manchete certamente vai parar na campanha eleitoral de Dilma no ano que vem. Mas está mais no terreno da licença poética do que dos fatos. Ou, então, alguém me dê os fatos, os números, os dados.


“Olhem o oposicionista aí…”


“Olhem aí, o cara é de oposição mesmo! Não quer que o Brasil dê certo!” Bobagem! Não sou como os petistas, que anteviam o desastre do Plano Real, por exemplo. Até porque a candidata (ou candidato) de Lula não dependerá fundamentalmente da economia para ganhar ou perder a eleição.


A economia derrota ou elege candidatos só em circunstâncias extremas. Explico: se o país está no vinagre, fica difícil eleger alguém da situação. De mediana para cima, outros fatores começam a contar. Lembram-se da famosa frase de um assessor de Clinton sugerindo qual deveria ser a pegada contra Bush pai? “É a economia, estúpido!”. Num país então estagnado, acabrunhado, sem oportunidades, a “economia, estúpido” deu a vitória ao democrata. Mas “a economia, estúpido” — que ia muito bem, obrigado — não foi o bastante para Clinton fazer seu sucessor. Na reeleição de Bush filho, “a economia, estúpido” já estava cambaleante (mas longe da crise), e ele se reelegeu.


Vale dizer: se as coisas estão do “mais ou menos” para o mais, uma batalha em torno de alguns valores — refiro-me a valores imateriais mesmo — pode ser bem mais efetiva. Com o país mergulhado na maior crise de sua história, Obama triunfou (mesmo com ela, o democrata fez a “guerra cultural”. Corolário: governo não se reelege com economia ruim, mas economia boa não é condição suficiente para eleger ninguém.


Felizmente, já em Primeira Leitura, lá no longínquo 2001 — e quem me lê desde aquela data sabe disto —, afirmava que Lula jamais deixaria de ser mais ou menos conservador em economia; que não daria trela para o seu partido nessa área. E faria quantas “caridades” pudesse no que chama a sua “política social”. Assim, jamais esperei que seu governo fosse um desastre econômico. Apostava, desde sempre, e acertei em cheio, na barafunda ética, no rebaixamento institucional, no aparelhamento do estado, numa relação autoritária com a imprensa… Bem, o arquivo do blog está à mão, não é? Mas desastre? Jamais!


Assim, ainda que fosse verdadeira a afirmação de que “o Brasil sai da crise maior do que entrou”, isso não significaria um destino para a candidatura do governo. A minha preocupação em relação a isso é ZERO! Até porque, confesso, governos petistas são um prato cheio para blogs (para alguns, é cofre cheio mesmo)… Apenas acho que, nessa área do jornalismo, deve-se evitar o que é uma espécie de linguagem figurada. Pode até ser que o Brasil venha a fica maior depois da crise, MAS NÃO SERÁ POR CAUSA DELA. Na verdade, para que chegue lá, terá de vencer algumas dificuldades que as ações do governo lhe impuseram sob o pretexto de enfrentar a crise, como o brutal aumento de gastos públicos.


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