Tudo indica que a batalha de Honduras terminou e com o mesmo resultado do confronto entre Davi e Golias. Por mais surpreendente que seja a vitória dos democratas hondurenhos, contudo, o que mais me surpreende é o poder da retórica dos apoiadores de Manuel Zelaya: Brasil, Cuba, Espanha e Venezuela, que conseguiram fazer prevalecer a versão de que ocorreu no país um golpe de Estado nos moldes dos que ocorriam na América Latina nos tempos da Guerra Fria, a partir do único deslize*, por assim dizer, na destituição de um presidente que infringiu a Constituição, com vistas a se perpetuar no cargo.
A partir dessa conversa fiada, o Brasil simplesmente interveio em Honduras, tomando claramente o partido de Zelaya, sem que essa escancarada intromissão na política de um país estrangeiro fosse seriamente questionada, exceto pelo próprio governo provisório de Honduras, que levou o caso à corte de Haya. Essa conversa fiada também foi utilizada para justificar uma pressão norte-americana pró-Zelaya, que só não produziu resultados graças à rápida mobilização dos republicanos no Congresso dos Estados Unidos, capitaneados pelo senador DeMint**, que reverteu a tendência de atuação do governo Obama.
A tese do golpe antidemocrático em Honduras - vamos chamar assim - me parece revelar, entre outras coisas mais evidentes, a persistência do passado no presente: o fantasma dos golpes militares dos anos 1960 ainda assombra muita gente e foi o fiador da retórica antigolpista comandada, ao menos explicitamente, pela diplomacia brasileira. Apesar de sustentada pelo Legislativo, pelo Judiciário e, sobretudo, pela Constituição hondurenha, a legalidade da destituição de Zelaya e do governo que o sucedeu não conseguiu se sobrepôr à tese do golpe, de modo que a versão prevaleceu sobre o fato na imprensa, nas instituições internacionais, no cenário diplomático.
Prevaleceu e prevalece: essa mesma versão deve sustentar a "retirada estratégica" do exército de Celso Amorim e Marco Aurélio Garcia do campo de batalha. O Brasil não há de reconhecer o resultado das eleições em Honduras até que o presidente eleito tome posse ou algumas semanas depois disso. Só então a troika Lula, Amorim e Garcia vai se dignar a reconhecer que os fatos mudaram, que é preciso olhar para a frente e que, como já não estarão tratando com golpistas, podem reconhecer o governo de Porfirio Lobo.
Notas:
* O deslize, evidentemente, foi Zelaya não ter sido preso, mas deportado e deportado de pijama. O pijama causou espécie à mídia brasileira, embora, convenhamos, tivesse sido muito pior se Zelaya fosse deportado sem pijama.
** Em seu boletim Freedom Alert, o senador DeMint comemorou a vitória da batalha de Honduras, com palavras que traduzem o espírito da democracia norte-americana e que transcrevo a seguir, sem tradução, porque hoje é sábado:
"This past Sunday, Hondurans secured a victory for democracy and the rule of law after they voted for a new president in free and fair elections. This only happened after they took a courageous stand against international pressure to reinstate the disgraced Manuel Zelaya, a close ally of Venezuelan dictator Hugo Chavez and the Cuban Castro brothers, who had tried to install himself as a dictator.
Initially, the Obama Administration supported Zelaya, but they have recently reversed this flawed policy and committed to stand with the Honduran people and their fight for freedom. As a member of the Senate Foreign Relations Committee, I applaud the Obama Administration for now recognizing the election of Porfirio Lobo as Honduras' new president, and look forward to restoring our relationship with Honduras, a faithful U.S. ally."
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