quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

Crise capitalista mata a esquerda

Por Sérgio Malbergier da Folha de São Paulo


Você conhece alguém que tenha se tornado "de esquerda" (como isso soa antiquado!) com a atual crise do capitalismo?


O sistema mais uma vez agoniza. Mas se nos anos 1930 essa agonia fortaleceu totalitarismos à esquerda e à direita, desta vez a saída é para o centro. Ainda bem.

Ninguém que conta quer revolucionar nada, mas aperfeiçoar (o que por enquanto significa limitar) as poderosas forças do mercado e da livre iniciativa.

A crise global serviu para mostrar os limites atuais do liberalismo econômico, assim como os ataques do 11 de Setembro frearam o avanço das liberdades individuais.



Mas são dois movimentos convergentes, inevitáveis em nossa cultura individualista, baseados na percepção, cada vez mais óbvia para mais gente, de que quanto menos o governo interferir em nossas vidas e quanto mais formos donos dela, melhor.



Pois por mais que se fale da importância do Estado neste momento, ninguém o defende como solução permanente para as necessidades de desenvolvimento das nações. Muito pelo contrário.



A emergência da China capitalista fechou o círculo econômico global. O capitalismo foi flex o suficiente para abraçar o maior Partido Comunista da história que conduz a maior expropriação de mais-valia do mundo para lucro de grandes corporações ocidentais.



E todos estavam felizes com o casamento. Até o colapso do sistema financeiro como o conhecíamos e sua dolorosa recomposição.



Nos Estados Unidos de Barack Obama, o maior líder global e sua equipe deixam claro sempre que podem que o estatismo da hora é tão inevitável quanto indesejável no longo prazo. A Europa também está fincada do centro para a direita, como na Alemanha, na França, na Itália e no Reino Unido (sim, o trabalhismo britânico é de direita).



Na Ásia, o capitalismo enriqueceu os principais países da região, com a exceção óbvia da obscurantista Coreia do Norte, que repele pelo exemplo.



Na América Latina, os dois líderes mais populares são Lula e Álvaro Uribe, o presidente da Colômbia, ambos também de centro-direita no diapasão macroeconômico.



A tal Revolução Bolivariana de Hugo Chávez e Cia parece mais uma paródia da paródia, "Bananas" de Woody Allen levado à vida real por personagens ainda mais autênticos, dirigidos por Zé Celso Martinez.



O petrocaudilho venezuelano, por exemplo, apenas clona o modelo da antiga República venezuelana que dividia a renda da venda do petróleo aos EUA entre os apaniguados de AD e Copei. Agora a divisão é entre os favoritos do ex-coronel que quer ficar eternamente no poder, como seu ídolo Fidel Castro, o ditador de pijamas, que colocou seu irmão Raúl no comando modorrento de um regime moribundo. Quem quer isso?



Quem quer a rigidez, a prepotência, a ineficácia e a corrupção inevitáveis dos governos pantagruélicos? Ninguém. Ou quase ninguém.



As viúvas mais enrustidas da foice e do martelo tentam gritar que a solução para a aguda crise do capitalismo são as antigas ilusões socialistas tão desacreditadas pela história. No último Fórum Social Mundial, em Belém do Pará, até as mangueiras perceberam quão esvaziado está o movimento esquerdista global em plena crise capitalista.



A mão invisível que pune financistas inescrupulosos e suas muitas vítimas também golpeou, mortalmente, as pretensões da antiga esquerda de se reerguer como opção ao sistema hegemônico.


Um ganho colateral importante nessa triste crise transformadora.

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